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42ª ART BASEL: UM MAR DE TRANQUILIDADESÍLVIA GUERRA2011-06-2142° Art Basel De 15 a 19 de Junho, Basileia, Suiça É sempre com uma certa curiosidade que chego à cidade suíça que mais obras de arte junta durante uma pequena semana. Este ano, a Liste 16 – antecipando a abertura oficial da maior feira de arte europeia, a Art Basel – encheu o edifício industrial que a acolhe com uma pletora de artistas, coleccionadores, galeristas, críticos e directores de instituições culturais. Um pouco como a Independent Art Fair de Nova Iorque ou a jovem Sunday em Londres (desde 2010) a Liste, que é já uma feira institucional com 16 anos de existência, continua a mostrar artistas representados por galerias emergentes na cena internacional embora quase todos os participantes não sejam absolute beginners. No rés-do-chão da Liste 16 encontramos Diogo Pimentão, artista português residente em Paris com um solo show apresentado pela galeria Schleicher+Lange num profíquo frente a frente escultórico com a obra do britânico Sean Eduards exposto pelas mãos da Limoncello de Londres. A feira auspicia uma boa semana em Basileia e continua estimulante, com propostas que se apresentam de espaço em espaço, numa arquitectura labiríntica. Destaco entre outras as obras “invisíveis” de Wilfredo Prieto, vencedor do prémio Cartier em 2008 e de Ignacio Uriarte, ambos propostos pela galeria Nogueras Blanchard de Barcelona; este último com uma obra conceptual realizada em torno de utensílios de escritório que utiliza o desenho e a colagem como media, bem como o vídeo, que não estando presente no stand da galeria, constitui um autêntico “tour de force” da sua obra. A galeria romana Monitor apresenta Francesco Arenas e a suíça RaebervonStenglin que venceu o prémio de melhor apresentação na edição deste ano. Mostra entre obras de outros artistas, as esculturas de David Keating que surpreendem pela fragilidade no desequilíbrio entre materiais domésticos como a alcatifa ou a corda. Uma feira onde as descobertas parecem ainda possíveis. Na mesma tarde abriu a secção dos Statements e a área de projectos de grande dimensões, a Art Unlimited na 42ª Art Basel. Nos Statements destaca-se a obra de Petrit Halilaj que já surpreendera na última edição da Bienal de Berlim com “The places I’m looking for my dear are utopian places they are boring and I dont know how to make them real” (2010). O artista apresenta em Basileia uma instalação que ocupa todo o espaço do stand com um transplante de terra vinda do Kosovo, país originário do artista, e que se encontra agora para venda na Suíça. Falando com o artista percebi que não é fácil para um coleccionador assumir o risco de comprar uma parte do mapa mundi ainda que reduzida, já que o jovem artista gostaria de ver esta peça / terra / jardim num outro país, integrada de forma gradual numa outra terra. Metáforas contemporâneas... Este Statement traz de volta as questões que reúnem a humanidade em torno da arte, como diria Harald Szeemann: a questão da sua origem, o questionamento da sociedade e da economia e mostra, em toda a simplicidade, como um gesto profano pode dar de novo um sentido à arte. Um pouco nos antípodas das Iluminações propostas por Bice Curiger na Bienal de Veneza deste ano. É um Art Unlimited muito calmo e sem surpresas, como se vivêssemos o nosso dia a dia no navio do último vídeo de Hans Op de Beeck, Sea of Tranquility (2010), onde o artista retorna à análise sem palavras do humano, dos homens e mulheres de todas as idades, dos ritos sociais, da indiferença e das suas angústias. Dan Flavin, Mario Merz, Jason Rhoades e mesmo James Turrel são apresentados como se fosse tentada a recuperação da memória artística, na falta de novidades e sem que grandes descobertas fossem apresentadas nesta secção, habitualmente, a mais estimulante da feira. Na secção principal e no primeiro andar dedicado à arte contemporânea encontramos duas presenças importantes da Bienal de Veneza deste ano: Dora Garcia e Haroon Mirza. Dora Garcia trazida pela sua galeria espanhola Joana de Aizpuru apresenta a instalação Farenheit 451, e Haroon Mirza, que venceu o Leão de Ouro como novo talento na Bienal de Veneza, é apresentado pela Lisson de Londres. Este último vendeu inúmeras das suas obras no primeiro dia da feira como me contou a sua galerista seguramente sob o impacto do prémio veneziano. As suas instalações, onde o som sincopado de rave music se une a dispositivos que recuperam elementos de aparelhos musicais de todos os tempos foi a melhor surpresa no Pavilhão Italiano da Bienal de Veneza. Na cidade, os Art Parcours oferecem um itinerário diferente por lugares da cidade onde este ano se apresentam obras de Ai WeiWei, Joan Jonas, Ugo Rondinone e da dupla canadiana Janet Cardiff e George Bures Miller, que nos permite um percurso lyncheano numa gruta perto do rio onde um spritz veneziano poderá ser pedido no final. Esta iniciativa é comissariada por Jens Hoffmann. Werner Herzog abriu a secção Art Films com a estreia suíça de The Cave of Forgotten Dreams (2011) ou um regresso às origens da arte nas cavernas pré-históricas. Um filme documentário onde a partir de diversos depoimentos e entrevistas a investigadores e cientistas sobre achados arquelógicos precisos somos compelidos a revisitar a animalidade humana que assombra os nossos sonhos desde o início dos tempos. Um filme excelente que espero chegue às salas portuguesas. Na cidade encontramos também a colecção pessoal de Francis Alÿs, e o seu famoso projecto Fabiola, instalado no Museu da Vida Doméstica de Basel (Haus zum Kirschgarten). Este projecto constitui uma recolha e colecção de mais de 370 imagens com a efígie da santa romana imortalizada no retrato – hoje desaparecido – do pintor francês Jean-Jacques Henner (1885). A imagem de Fabíola reaparece glosada pela cultura popular em todo o mundo e Francis Alÿs recolhe e colecciona as sempre renovadas Fabíolas que nos fazem revisitar outras questões prementes na arte... Foi uma feira que pecou pela tranquilidade... mas que graças a estes encontros “satélites” à feira permitiu um momento de reflexão sobre a história. Sílvia Guerra Link Fabiola Archive de Francis Alÿs: www.schaulager.org/en/index.php?pfad=ausstellung/francis_alys_fabiola |