|
O SÍTIO DAS ARTES NO ESTADO DO MUNDO: NO CENTRO DA PERTINêNCIA, à MARGEM DAS EXPECTATIVASCRISTINA CAMPOS2007-08-06Instalado no espaço expositivo do CAMJAP entre Junho e Julho, o “Sítio das Artes” materializou-se num modelo de residência de artistas tutorizada (por Sérgio Mah e Lia Rodrigues) e apoiada em masterclasses a que o público teve acesso. Pretendia-se não só fomentar a aposta na formação e intercâmbio entre os jovens artistas participantes, como proporcionar o confronto dos visitantes com o desenvolvimento do processo criativo, potenciando-se também o diálogo entre os espectadores e os vinte artistas seleccionados (provenientes das artes visuais e das artes performativas). É possível, não obstante a sua originalidade, estabelecer alguns paralelismos com outras iniciativas decorridas na Fundação, caso do Programa de Criatividade e Criação Artística e a precedente exposição de Pedro Cabrita Reis. O Sítio das Artes na programação da Plataforma 2 do fórum cultural “O Estado do Mundo”, dirigido por António Pinto Ribeiro, acabou por não se revelar um lugar especialmente atractivo nem para o público, nem para os artistas que participaram no projecto. Pela incontestável originalidade e pertinência associadas à iniciativa - particularmente expressiva num contexto em que é urgente repensar o espaço museológico no processo de legitimação e fruição da arte contemporânea - as expectativas foram elevadas mas os resultados situaram-se aquém do planeado. Evidência que ressaltou sobretudo quando, no passado dia 28, os projectos que foram sendo desenvolvidos (os mesmos que estiveram na base da selecção) se apresentaram finalizados, através de um formato de “Open Studio”. Os constrangimentos acabaram, ao longo de todo o processo, por se revelar de diversa ordem e abrangeram ambas as variáveis (artista-produção /público-recepção) desta equação original, oportunamente colocada, mas com resultados imprevisíveis. Relativamente à recepção, a estranheza provocada no visitante nada habituado à desvirtuação da concepção modernista/contemplativa do espaço museológico, transformaram o “Sítio das Artes” numa experiência pouco convidativa e mesmo incompreensível para um público maioritariamente descontextualizado e desapoiado. Acrescente-se a indiscutível escassez de material expositivo para ser partilhado e a sensação de se estar num atelier encenado – estaria o local a ser verdadeiramente vivido? –, bem como a indisponibilidade perceptível em ambas as partes (ainda que por motivos diferentes) para estabelecer um diálogo. A implícita intenção de desconstruir algum do constrangimento face à arte contemporânea terá seguido, provavelmente para alguns, um fluxo precisamente inverso, contribuindo para o adensar. A produção, na referida equação, permaneceu igualmente envolta em algumas debilidades. Ao ter sido diluída a natural e saudável dualidade entre espaço de atelier e espaço expositivo, um conjunto de condicionamentos óbvios emergiram. Desde logo a própria génese subjacente ao atelier, local preferencialmente da esfera privada em que o artista, isoladamente e a um ritmo próprio, vai criando. A obrigatoriedade de ter que mostrar trabalho ou processos de trabalho em fase embrionária e parcial criou limitações igualmente confrangedoras. Muitas das vezes essas etapas revelam-se dificilmente materializáveis – à muito que a produção artística deixou de ser encarada enquanto trabalho maioritariamente oficinal – e é também inusual e questionável que o artista assuma o papel de intermediário relativamente à fruição das obras. Ou ainda que tenha que se expor, marcando a sua presença no espaço em horário pré-determinado. Um conjunto de hipóteses configuram-se em relação à possibilidade de contornar algumas das lacunas registadas. Critérios de selecção diferentes teriam, por exemplo, contribuído para minimizar a fronteira entre o desejável e o possivelmente concretizável? Será que artistas com processos de trabalho menos conceptuais, de carácter mais oficinal e com mais abertura para a interacção e exposição pública, teriam proporcionado resultados distintos? Fica, no entanto, a certeza do descontentamento demonstrado por alguns deles e a capacidade inventiva de outros para contornar e subverter algumas das fragilidades do programa recorrendo a estratégias recheadas de criatividade e humor. O Sítio das Artes acabou por não se revelar ao visitante prevenido do CAMJAP uma amostra fiável e segura. Faltou naturalidade ao processo, intuíram-se imposições, encenações e constrangimentos que disvirtuaram os princípios inicialmente definidos. Não chegando a estado de sítio, esta iniciativa acabou por não se revelar tão informal e despretensiosa quanto se desejaria. Todavia, independentemente das razões enunciadas, há que ressalvar o carácter experimental, de abertura e questionamento que envolveu o projecto, paradigmático das tensões que surgem quando, saudavelmente, se ousa transgredir formatos de programação e modos de expor mais formais e institucionalizados. Artistas: Ana Santos (Portugal), Ana Trincão (Portugal), Bárbara Assis Pacheco (Portugal), Beatrice Catanzaro (Itália/Suécia), Celestino Mudaulane (Maputo), Inês Botelho (Portugal), Joana Craveiro (Portugal), João Paulo Serafim (Paris/Lisboa), Juliana Penna (Brasil), Maria Gil (Portugal), Max Rosenheim (Madrid/Lisboa), Miguel Bonneville (Portugal), Miguelangelo Veiga (Portugal), Pedro Barateiro (Portugal), Simão Costa (Portugal), Susana Guardado (Portugal), Tatiana Macedo (Portugal), Vera Santos (Portugal), Virgínia Mota (Portugal) e Ynaiê Dawson (Brasil) www.o-estado-do-mundo.blogspot.com |