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NICOLAS GALLEY
Este mĂȘs publicamos uma entrevista a Nicolas Galley, historiador de arte, suĂço, de 35 anos, que dirige o Mestrado de Estudos Avançados em Art Market Studies (Estudos dos Mercados de Arte) na Universidade de Zurique. Conduzida por Rodrigo Carrizo Couto, a entrevista foi publicada originalmente no suplemento Babelia, do El PaĂs, de 11 de fevereiro de 2012.
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Nicolas Galley dirige um dos poucos mestrados internacionais em mercado de arte. Este professor suĂço considera que as galerias devem assumir riscos e mudar a mentalidade dos seus colecionadores. Para ele, a ARCO foi uma oportunidade perdida.
O professor Nicolas Galley identificou um problema no exigente mercado da arte internacional: as formaçÔes tradicionais nĂŁo preparam profissionais competitivos num negĂłcio que exige cada vez mais conhecimentos. Para preencher este vazio, Galley criou o Mestrado de Estudos Avançados em Art Market Studies (Estudos dos Mercados de Arte) na Universidade de Zurique. âNos Estados Unidos, mais de 60% dos profissionais do mercado de arte nĂŁo tĂȘm formação especĂficaâ, afirma este historiador de arte, suĂço, de 35 anos. Nesta conversa, Galley analisa algumas das chaves do mercado de arte atual e observa as realidades de Espanha, China ou AmĂ©rica Latina.
P: A crise atual afeta todas as esferas da vida, mas parece nĂŁo tocar no mercado de arte. Como se explica isto?
R: O assombro desta crise generalizada Ă© que hĂĄ sectores que nĂŁo se vĂȘm afetados. SĂŁo a arte e o luxo. A crise toca as classes mĂ©dias e trabalhadoras, mas as pessoas com fortunas parecem imunes aos problemas.
P: PorquĂȘ?
R: Porque a arte Ă© uma alternativa estabilizadora perante um mercado financeiro imprevisĂvel. Dado que as grandes fortunas nĂŁo se vĂȘm afetadas pela crise atual, muitos grandes investidores diversificam a sua carteira no mercado de arte. Mas as vendas, apesar de tudo, nĂŁo sĂŁo tĂŁo boas como em 2006. Obviamente, isto nĂŁo se aplica Ă s obras de primeira qualidade, mas este tipo de peças Ă© muito raro no mercado. Os seus proprietĂĄrios sĂŁo reticentes ao vender os seus tesouros.
P: O pĂșblico interessa-se pelos nĂșmeros das vendas milionĂĄrias.
R: Certo, mas Ă© importante entender que a maioria das obras que se vendem varia entre os 5.000 e os 10.000 euros. As operaçÔes de venda por 10 ou 20 milhĂ”es nĂŁo se vĂȘem todos os dias, mas chamam a atenção mediĂĄtica.
P: Qual Ă© o retrato robot do colecionador do nosso tempo?
R: Esclareçamos que hĂĄ colecionadores, e gente que compra arte. NĂŁo sĂŁo o mesmo. O colecionador nĂŁo Ă© um especulador, vĂȘ a sua iniciativa como um investimento a longo prazo. O colecionador tem uma ideia precisa do que faz e procura um sentido no seu colecionismo. Ă alguĂ©m muito consciente das suas eleiçÔes. As suas motivaçÔes passam pelo prestĂgio social, a satisfação intelectual, a vontade de posse ou de criar. Costumam ser pessoas entre os 40 e os 70 anos.
P: E que retrato faz do visitante da ARCO Madrid?
R: A ARCO foi muito importante, e em termos de visitantes continua sendo. O seu potencial foi grande, mas perdeu quase toda a sua influĂȘncia e o apoio das grandes galerias. A ARCO Madrid perdeu a sua oportunidade histĂłrica de se posicionar como a referĂȘncia para a AmĂ©rica Latina. Esse lugar jĂĄ o ocupou Art Basel Miami Beach e duvido que o vĂĄ deixar a mĂ©dio prazo.
P: E o colecionador espanhol?
R: Lamentavelmente em Espanha não hå uma grande tradição de colecionadores. Quase todo o mercado vive da esfera institucional, e com o Estado espanhol atualmente quase em quebra, pergunto-me quem irå comprar.
P: O que podemos fazer para fortalecer o mercado espanhol? Continuamos a apostar neste mercado dependente do Estado ou vamos em direção a um modelo misto?
R: A SuĂça Ă© um bom modelo, pois soubemos desenvolver uma excelente network entre instituiçÔes que formam jovens capazes de competir no mercado globalizado, galerias, feiras e mercado. HĂĄ que apostar em galerias que assumam riscos. Mas apenas injetar dinheiro nĂŁo Ă© a resposta. HĂĄ que lutar para mudar as mentalidades atravĂ©s de ideias inovadoras. TambĂ©m se devem dar incentivos fiscais sĂ©rios a quem aposte pela compra de arte emergente espanhola.
P: Como vĂȘ a arte latino-americana de hoje?
R: A AmĂ©rica Latina estĂĄ rapidamente a tomar as posiçÔes que a Espanha perde. Em particular, o Brasil sabe apostar com muita força e com muita coerĂȘncia na nova criação nacional. Assim como na SuĂça, as relaçÔes entre instituiçÔes, galerias e artistas funcionam muito bem.
P: A pintura continua a dominar o mercado? E os restantes formatos?
R: A pintura volta com muita força apĂłs um relativo desaparecimento nos anos noventa. A fotografia perde interesse apĂłs o boom da Escola de DĂŒsseldorf. O vĂdeo continua a ser muito difĂcil de digerir pelo mercado. Ă aceite, mas nĂŁo existe um colecionismo real. No ano 2000 toda a gente se pĂŽs a fazer vĂdeo, mas hoje os artistas voltam aos suportes tradicionais. Igualmente os criadores distanciam-se cada vez mais da arte conceptual, ainda que o mercado o tenha integrado depois de uma longa travessia no deserto. Com efeito, o mercado de arte nĂŁo rejeita nada. Tudo pode ser integrado de uma ou de outra forma. O mercado demonstrou ser capaz de suster todas as vanguardas do sĂ©culo XX.
à sustentåvel a atual proliferação de feiras? à vålido que cada cidade de 50.000 habitantes queira dispor de uma bienal ou um museu?
P: Não. à absolutamente insustentåvel. Não hå lugar para mais feiras de arte. Mas o que realmente conta é a qualidade das feiras satélites que crescem à sombra dos grandes eventos. Um bom exemplo é Art Basel e Liste. Alimentaram-se mutuamente: a fama de uma reverte para a outra.
P: Sempre a referĂȘncia a Art Basel.
R: Ă que a Art Basel faz com que cada galeria faça o mĂĄximo de esforço e traga o melhor do melhor. Outras feiras baseiam-se na novidade ou numa arte determinada, mas a Basileia sĂł vem a nata da arte mundial. Apesar de que hĂĄ feiras menores, com Artissima, em Turim, que me parecem valiosas. Ă uma feira de altĂssima qualidade, onde todas as galerias sĂŁo jovens e assumem riscos.
P: Falando consigo, parece que no mercado de arte sĂł hĂĄ lugar para gigantes.
R: NĂŁo. Mas aqui falamos do grande mercado de arte internacional. Mas, obviamente, existe espaço para galerias e artistas de pequena escala, que se movem entre os 5.000 e os 10.000 euros. O que ocorre Ă© que estes artistas dificilmente farĂŁo parte de coleçÔes de primeiro nĂvel, nem serĂŁo validados pelos grandes museus.
P: PorquĂȘ?
R: Porque um artista Ă© considerado um peso pesado se a sua obra chega a superar os 100.000 e nĂŁo tem ainda 35 anos. Mas o interessante Ă© que no mercado de arte nĂŁo hĂĄ saldos. Se um artista chega a um certo nĂvel de preços, nĂŁo marcha atrĂĄs. Em vez de baixar o seu preço, os galeristas preferem fazĂȘ-lo desaparecer do mercado. NĂŁo o expĂ”em durante vĂĄrios meses e o artista em questĂŁo, simplesmente evapora-se. AlĂ©m disso, um desconto seria um mau gesto perante um colecionador que tenha pago por uma peça 20. Como lhe explicar que outro pague 10 pelo mesmo artista?
P: Que lugar hĂĄ para artistas jovens e emergentes? O mercado continua a apostar no Ășltimo jovem exĂłtico saĂdo da Saint Martinâs de Londres?
P: Hå sempre lugar para novos artistas. Ainda que a juventude não é em absoluto garantia de inovação, mas o mercado adora a novidade pela novidade em si. Mas o certo é que hå uma sobreabundùncia de gente que tenta penetrar no mercado de arte. Agora qualquer um improvisa como curador ou galerista e vai pelo mundo com uma pasta dos seus artistas debaixo do braço.
P: E os artistas nĂŁo se fabricam? Quem os cria? O tempo?
R: Os fazedores de artistas sĂŁo um grupo seleto de curadores, galerias e museus. Eles decidem o que Ă© e o que nĂŁo Ă© arte. Em todo o mundo hĂĄ umas 200 galerias que fabricam artistas. E entre essas 200 galerias hĂĄ 30 que o decidem no mercado de arte globalizado. Mais de 30% dos artistas representados na Art Unlimited (na feira Art Basel) vĂȘm das mesmas oito galerias, o que dĂĄ uma ideia do seu poder.
P: Frequentemente oiço que o comĂ©rcio de arte Ă© o Ășnico negĂłcio seguro, que permite retirar benefĂcios de 200%. Ă fantasia?
R: Nem todos ganham! Hå muitos perdedores neste grande jogo. E não nos esqueçamos que muitos artistas desaparecem após uma década. A imensa maioria de artistas que se expÔem hoje, não passarå a prova do tempo.