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WHAT IS WAITING OUT THERE![]() ROSANA SANCIN2010-07-28![]() 6ª Bienal de Berlim what is waiting out there 11.6.- 8.8.2010 A sexta Bienal de Berlim, comissariada por Kathrin Rhomberg, está espalhada por seis sítios diferentes, nos bairros de Mitte e Kreuzberg, e toma como ponto de partida a relação entre a arte e a realidade. A curadora refere-se ao escritor húngaro Imre Kertész e ao seu livro Liquidation, onde indica que a única certeza que podemos ter sobre a realidade é que esta se tornou “um termo problemático, e para além disso, sendo pior ainda, um estado problemático.” As posições artísticas aqui representadas têm em comum uma forte postura em relação ao presente, mesmo que as perspectivas difiram entre o empenhamento mais analítico, especulativo ou associativo. As abordagens vão para além das questões formais ou estéticas, ou outras inerentes à arte. Trata-se acima de tudo de obras que literalmente produzem a nossa realidade e de alguma maneira nos devolvem ao título da bienal: “what is waiting out there”. A presença de jovens artistas albaneses é particularmente visível, como também a inclusão de vários artistas turcos e israelitas, sob a luz do último incidente que ocorreu em Gaza. É preciso mencionar também a atitude eficaz dos artistas árabes, parisienses par excellence, na altura de debate frenético sobre a proibição do uso da burka em espaços públicos. Na sede da bienal, em Kunst Werke(KW) , somos logo confrontados com a obra “ The places I’m looking for, my dear, are utopian places, they are boring and I don’t know how to make them real”, 2010, do artista Petrit Halilaj (n. 1986). Trata-se duma enorme instalação em madeira que penetra o tecto da sala expositiva, associada à reconstrução da casa dos avôs do artista, no Kosovo, que foi destruída durante a guerra da Jugoslávia. E, de facto, parece uma ruína, carregando a memória da catástrofe. O artista foi o único membro da sua família a escapar dos terrores da guerra, emigrando primeiro para Itália e a seguir para Berlim. O vídeo do artista turco Ferhat Özgür “I Can Sing” (2008), mostra um país dividido entre o Oriente e o Ocidente. Os prédios altíssimos tocam o céu tradicionalmente dominado pelos minaretes. Em frente à sua casa reconstruída, a mulher, vestindo o “headscarf”, oscila entre o lamento e elogio. A banda sonora, “Hallelujah” na versão amarga de Jeff Buckley, complica ainda mais a relação entre as duas partes do mundo, supostamente em conflito. Avi Mograbi (Tel Aviv) diz que não se pode falar de violência sem dela ter experiência, seja como vítima ou perpetrador. No seu filme “Details 2&3” (2004) mostra, através de cenas documentais e encenadas, a impossibilidade de qualquer visão objectiva em relação ao assunto, afirmando em vez disso uma posição individual em confronto com as imagens sugeridas pelos mass media. A série de fotografias “Çirçir” (2010) da artista Nilbar Güres foi especialmente produzida para a bienal na antiga casa da sua família nas margens de Istambul. Um lugar decididamente patriarcal representa um microcosmos de estruturas sociais. A artista trabalhou com mulheres das mais variadas origens culturais, orientações sexuais e níveis de educação, com o objectivo de ocupar temporariamente, segundo a autora, domínios normalmente considerados apanágio do sexo masculino. Uma posição interessante e não muito esperada vinda de uma artista de cultura muçulmana que supostamente (de acordo com as latest news) reprime as mulheres. Provavelmente a mais bem conseguida obra da Bienal de Berlim é “Zone” (2010) de Roman Ondák (Bratislava) apresentada na Oranienplatz 17, outro grande espaço da bienal. O artista instalou um bengaleiro de tamanho desproporcional logo à porta de entrada. O visitante na melhor das opções acha estranho o tamanho do bengaleiro, mas como se trata de uma grande exposição internacional numa das capitais de arte, isto não surpreende tanto. Para quem viveu na Europa de Leste, o espaço remete imediatamente para o regime socialista. É o tamanho excessivo, o vazio e o desconforto ali associado. Talvez a repressão. Se bem que as pessoas mais velhas dizem que a repressão hoje em dia, sob um outro regime e sistema económico, é bem maior. O artista vietnamita Danh Vo abre a porta do seu apartamento-atelier na Kohlfurter Strass 1, em Kreuzberg, aos visitantes da bienal. E para acabar este artigo gostava de publicar ainda a carta de despedida do missionário francês J. Théophane Vénard ao seu pai. Cada edição da obra “Untitled” (2009) é a cópia desta carta escrita à mão pelo pai de Danh Vo. O número exacto das edições vai ser definido após a morte do seu pai. J. M. J January 20, 1861 Dearest, honored and beloved Father, Since my sentence is yet to come, I wish to adress you a new farewell, probably the last one. My days in prison are going by peacefully. Everyone around honors me, and many even love me. From the great Mandarin to the last soldier, all regret that the law of the kingdom condemns me to the death sentence. I have not endured any tortures, like many of my brothers. A slight strike of a sword will behead me, like a spring flower picked by garden Master for pleasure. We are all flowers growing on this earth, picked by God at some point, a little earlier for some, a little later for others. One is the crimson rose, another the virginal lilly, another the humble violet. Let us all try to please the Lord and Master, with the perfume or radiance we were given. I wish you, dear Father, a long, peaceful and virtuous old age. Bare your life cross gently, following the path of Jesus, till the calvary of a felicitous death. Father and son will meet again in heaven. I, a small transient being, am to leave first. Farewell. Your devoted and respectful son. J. Théophane Vénard Rosana Sancin Curadora e crítica de arte. Vive entre Liubliana e Lisboa. |