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POLAROID
CARLA CARBONE
Está patente, na galeria "Lisbon Gallery - Design & Architecture", a exposição "Polaroid", até ao dia 29 de abril.
Vários designers expõem peças que denunciam as maiores preocupações desta nova geração: a sustentabilidade e o respeito pelos materiais.
Ao material é dada uma atenção exploratória. Escuta-se o "erro". Deixa-se que o mesmo potencie e desencadeie uma determinada forma. Uma determinada funcionalidade. E é essa predominância sobre o material que salta à vista na exposição. Do material em bruto, da sua verdade.
As novas gerações procuram perceber as qualidades intrínsecas e poéticas dos materiais. Desenham em torno do princípio de que o material comunica. Deixam que ele dite as suas próprias leis, sem tentar enquadrá-lo em tipologias. O material contém os traços da sua própria tipologia, da sua própria geneologia. Porque é próprio dele a propriedade técnica, estética e funcional.
Os designers, mais atentos ao fluxo dos materiais, ao seu pulsar, permitem que os mesmos, de forma natural, desencadeiem novos modos de ver, novas estéticas, novas formas até aqui ocultas pelo silêncio em que se viram votados, engolidos por uma estética industrial, que não admitia o erro, o inesperado. Ditado pela ULM, ou por Edgar Kaufmann Jr.
Jarra "Layers", de Vítor Agostinho, para Vicara.
Vítor Agostinho, um dos designers presentes nesta exposição, fala dessa permissão do erro nas peças que desenvolve e de como esse erro ou falha originam resultados que tornam cada peça única e diferente das demais. As impressões únicas nos objetos são exploradas nas suas jarras "Layers", feitas em faiança. Pequenos moldes em forma de anel são colocados uns sobre os outros e unidos no momento em que recebem a matéria líquida. O resultado é uma peça em louça branca cuja superfície apresenta-se rugosa, formada pelas ranhuras dos anéis, quando ligadas.
Cada saliência horizontal sai, felizmente, fora da normalidade. Cada uma traz uma história diferente. Uma mais saliente, outra menos. Do que Agostinho gosta é justamente essa diferença, tão possível por meio de uma motivação experimental, mais poética. Formando narrativas próprias, identidades únicas, imperfeições salutares, imbuídas num certo espírito essencialista orgânico, a que deixa entrar a narrativa, a história do objeto.
Jarra "Imperial Market" (2014), de Bruno M. M. Carvalho.
Bruno M. M. Carvalho, também presente na exposição, ilustra essa narratividade, reforça a problematização em torno da estética funcional, precisamente pela narrativa, levanta questões de ordem conceptual, de como o objeto pode conter história, memória, e relembra a ligação estreita do design com a arte.
Carvalho, que se caracteriza por ser um designer sem estúdio, situa-se nesse território do permutável, do fluxo, do gesto.
As sua jarras "Imperial Market" (2014), colocadas numa fileira de seis, demonstram esse fluxo, de vaga no tempo.
Carvalho é um designer viajante. Ele próprio diz que estas jarras não teriam acontecido se não tivesse ido à China, local onde pode absorver todas as experiências para as fazer: "Essas peças não poderiam ter surgido se eu não tivesse tido oportunidade de ir aquele pais", coisa que na altura o designer não estava à espera que acontecesse.
As jarras Imperial surgem assim desse inesperado e de um movimento que se imprime na própria mancha azul que a pouco e pouco vai inundado cada jarra, até a última ficar totalmente imersa no líquido azul.
Vaso "De Terra", de João Margarido.
João Margarido, por sua vez, é um coletor nato. Para desenvolver as peças que criou, recolheu porções de terra oriundas de vários pontos do país. As suas peças fazem respirar a matéria. As formas denunciam o seu modo de preservar o que é intrínseco ao material, a sua natureza, com laivos de sustentabilidade, constituindo um elogio ao autóctone.
O material dá forma mas, em simultâneo, comunica a sua natureza interna. A sua lei.
Vilem Flusser referiu algures: "O discurso do design situa-se entre a materialidade e a imaterialidade"
Outros designers presentes nesta exposição, são: Eneida Tavares, Geckeler Michels, Gonçalo Campos, Jorge Carreira, Joschua Brunn, Manuel Amaral Netto, Paulo Sellmayer e Rita Martins.
Carla Carbone
Estudou Desenho no Ar.co e Design de Equipamento na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Completou o Mestrado em Ensino das Artes Visuais. Escreve sobre Design desde 1999.