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Mesmo a arte + simples pode levar a uma complexidade de pontos de vista fabulosa. E o contrário também é verdade: podemos erguer uma complexa obra de arte com vários níveis, que não produzirá nada a não ser esterilidade, onde nenhum questionamento irá cair jamais.
Diante deste momento, de certa forma, arte e mecânica quântica, duas matérias aparentemente sem relação uma com a outra, podem viver lado a lado - por razões de incerteza!
Em traços simples, alguma arte não faz sentido; outra parece puramente errada. Isto significa inevitavelmente muitos estados de incerteza. É análogo a como um sistema quântico pode existir em vários estados de incerteza antes de ser analisado, quando infinitas possibilidades colidem numa única versão da realidade.
De facto, cada observador dará uma visão diferente de Les Demoiselles d'Avignon de Picasso. Quase poderíamos falar de muitas pinturas de Les Demoiselles d’Avignon, afastando-se a ideia que a arte pode ser determinada, isto é isenta de relações, o que nos faz dar um verdadeiro passo em frente. O significado da arte não é religião (uma crença baseada na fé, uma espécie de devoção e de amor espiritual onde existe o divino), não é moral. E com a diferença também de que não se trata de compreendê-la, trata-se de senti-la de modo profundo, de senti-la de corpo e alma. Diz respeito à experiência sensível, à capacidade de questionar, de viver alguma forma desta experiência ligando percepções, associando-as a afetos, dando-lhes um significado.
Ou, melhor dizendo, podemos pensar, devemos pensar que não é importante a nossa crença na arte: o essencial é crer na sensibilidade e na intuição; ou sentimos a beleza ou não a sentimos. As observações não apenas perturbam o que vai ser avaliado, elas produzem-no. Não há nenhuma realidade que exista de modo independente.
A teoria não nos diz como é que a pintura se realiza em relação a nós.
Não é portanto surpresa se não sentirmos a arte, se não tivermos um sentimento de beleza, se uma obra não nos despertar emoções, se não nos levar ao desejo de saber mais; o autor não a criou para nós. Ponham-na de lado, que a arte é suficientemente rica para nos oferecer algum autor digno de emoção, ou indigno hoje de atenção e que iremos apreciar amanhã, o que acontece quando uma pessoa é afetada pelo que viu, ouviu e leu. Essa pessoa deixa de ser quem foi, pode agir de forma diferente. Mas é precisamente isso que não pode ser quantificado. Essas pequenas mudanças que a arte desencadeia não são fáceis de explicar é a sua vida subterrânea - uma forma de energia inconsciente / alienígena, que é invisível mas nem por isso menos real.
“Assim que me torno consciente do que a tinta está a fazer, o meu envolvimento com a pintura enfraquece”, disse Frank Auerbach uma vez. “A pintura é mais eloquente quando é um subproduto de algum conceito imaginativo corpóreo, espacial e em desenvolvimento, uma identificação criativa com o assunto.”
Desta forma, o passo seguinte é parte do anterior: a arte nunca foi tão intelectual como muitos pensam, embora atinja estados muito complexos. Não é uma ciência, mas simplesmente uma arte. Não é um veículo utilizado para comunicar uma mensagem, vinculada a uma ideologia ou submetida ao estado de dominação. Sim, expressa questões que são independentes de explicações com o propósito de fornecer uma razão incontestável. Ela significa, antes de tudo, a proximidade entre o sujeito e o objecto, de modo que o sujeito passa a fazer parte do objecto. Relembra um estado de não-dominação, aquilo que ainda não foi submetido ás regras da sociedade administrada, o único lugar de liberdade possível. Talvez devido à natureza da arte, a obra de arte não afirma alguma coisa, porque o questionamento é sempre retomado, regressa sempre em função dos jogadores e do sistema que eles constroem e criticam. Não tem como principal papel fornecer afirmações particulares. Desta forma continua a viver e a reativar-se na memória e na imaginação dos homens.
É a liberdade que assegurará o futuro da arte.
Isso é totalmente contrário daquilo que acontece na indústria cultural. Esta imita o sujeito, mostrando-lhe apenas o que ele percebe por si mesmo (que, na verdade, já está pré-determinado), na sua vida quotidiana. O que a industria cultural procura fazer, no processo de racionalização, é distanciar o sujeito do objecto, dando ao primeiro o poder de dominar o outro.
A arte, pelo contrário, procura relembrar o sujeito da sua dimensão natural. Não pode ser instrumentalizada para servir um argumento/ propósito intelectual e político, que lhe possa atribuir uma finalidade elementar (definida por ser básica e fácil). Essa instrumentalização tem uma utilidade prática, contribui para respostas com o propósito de fornecer narrativas convenientes e na promoção de uma verdade, linguagem e razão incontestável, servir que não está necessariamente relacionado com a sua natureza.
Significa que a arte tem + afinidades com o sentimento do que com o intelecto. Não é também resultado de um caminho científico, não envolve a descoberta de propriedades de entidades que são estipuladas por axiomas… e o uso da razão pura para prová-las. É o contrário: Estamos à procura de explicações que nos satisfaçam emocionalmente. A arte é uma coisa imaginativa que se sente. É criada pelo intelecto mas graças à motivação que lhe é dada pela vida dos sentimentos. É visual e sobre a beleza e sobre o arrebatamento e a maravilha.
Tem a ver com o inconsciente tanto quanto com a mente, ou talvez +. Afastamo-nos do lógico, do científico. Apesar da ciência e da arte poderem viver lado a lado, durante um intervalo de tempo - na verdade, a identidade da ciência é uma coisa, e a arte é outra completamente diferente. Basta comparar as duas. Partilham a verdade interior - a incerteza, a curiosidade e a imaginação que caracterizam o questionamento - mas diferem na construção da identidade exterior. São classificações e funções diferentes. A arte não procura descobrir soluções para os problemas; creio que não há nenhuma dúvida quanto a isso.
Em resumo, arte e ciência separam-se — diante da sua classificação.
A ciência no entanto pode ser um portal para a arte, para que artistas possam estabelecer interações e relacionamentos surpreendentes entre a ciência e a arte.
Tomemos como exemplo Liquid Reflections (1968) de Liliane Lijn:

Liliane Lijn: Liquid Reflections, 1968. Photo Stephen Wiess. Courtesy The Artist And Rodeo, London
A física quântica inspirou a obra-prima de Lilian Lijn (1939), Liquid Reflections. Para Lijn, a ciência é um mistério que convida à maravilha. Ela integra enigmas quânticos no seu trabalho, tornando-os + compreensíveis e e fáceis de observar, tudo sem diminuir a admiração inexplicável. Liquid Reflections consiste num disco oco de acrílico, contendo água e girando sobre uma plataforma giratória motorizada. Na sua superfície, giram duas esferas de acrílico, o seu movimento sujeito a forças opostas: a força centrífuga da rotação do disco e a força centrípeta devida à concavidade da superfície do disco.
Quando a água é vertida no disco, condensa-se em padrões que se assemelham a nuvens interestelares de gás, mas logo se contrai em gotículas esféricas precisas, vivas e trémulas, que por sua vez se tornam cada vez mais homogéneas, cobrindo toda a superfície do disco. A água no disco influencia o equilíbrio geral e é influenciada por este, exercendo um efeito sobre o movimento das esferas.
O movimento das esferas na superfície do disco é regido pelas leis do momento linear, bem como pela força centrífuga e pela força da gravidade induzida pela concavidade do disco. As esferas funcionam também como lentes de aumento móveis, dando vida ora a uma zona do disco, ora a outra, com uma estranha paisagem lunar de reflexos e sombras. Liquid Reflections é a tentativa de Lijn de contemplar o universo a uma escala intimista; como a luz se poderia comportar simultaneamente como partícula e onda — um fenómeno notoriamente impossível de observar. Mas esta não é uma ilustração didática ou técnica: é encantadora e hipnotizante.
Recentemente (março 2025) a Penguin editou o livro Liquid Reflections, livro de memórias de Lijn - retrato da artista pioneira na interação de arte e ciência quando jovem.
Lilian Lijn é alguém que constantemente coloca arte e ciência lado a lado - o que permite a criação de obras em que arte, ficção científica e física quântica convergem, destruindo identidades autónomas.
É nesse sentido que também podemos falar de uma verdadeira mente científica em Gustav Klimt. Klimt, leu “A Origem das Espécies” (1859), de Charles Darwin, e assistiu às conferências de Carl von Rokitansky, o visionário reitor da Escola de Medicina de Viena. A ideia inovadora de Rokitansky era que, no que diz respeito à saúde, o passado afetava o presente e para encontrar a verdade médica “é preciso ir bem abaixo da pele”. Para a ciência, isto significava descer ao nível microscópico para compreender a superfície. Klimt pegou nesta ideia e incorporou-a nas suas pinturas.
Está presente em A Árvore da Vida (1909), com células ovulares a subirem do solo até ao tronco da árvore — o próprio motivo que representa a evolução de todas as formas de vida na Terra. As células aparecem em Portrait of Adele Bloch-Bauer (1907) a emergir dos turbilhões de ouro para se transformarem no ar que a modelo respira. O mesmo acontece com The Kiss (1908), com o corpo da mulher salpicado de formas celulares de cores diferentes — um artigo de investigação vê glóbulos vermelhos e aponta para as ilustrações microscópicas do naturalista Ernst Haeckel que Klimt provavelmente viu.
Na verdade, torna-se difícil ver os círculos de Klimt como algo mais do que uma evidência do seu profundo interesse pelo microscópico. Danae (1907) oferece talvez a evidência mais convincente. No mito grego, o rei Akrisios de Argos fecha a sua filha numa câmara de bronze temendo o cumprimento da profecia de que seria morto pelo seu neto.

Gustav Klimt: Danae, 1907-1908. Leopold Museum, Vienna
Klimt capta o momento em que Danae é visitada por Zeus, que surge como uma chuva de moedas de ouro. O rei dos deuses é irreprimível e potente e por isso Klimt marca o vestido roxo de Danae com formas ovalóides cheias de linhas onduladas. São blastocistos, aglomerados de células em divisão feitos por um óvulo fertilizado, uma fase inicial de um embrião que Klimt encontrou através do trabalho de Przibram.
É a prova não só de que Danae está grávida e de que a profecia está viva e de boa saúde, mas também de que Klimt pode contornar a censura nos assuntos mais delicados — com uma pequena ajuda da ciência. É realmente tão científico como artístico.
E a arte pode ser lida cientificamente? Envolver criticamente cientistas? O conhecimento da ciência acrescenta profundidade à compreensão da arte e da sua história?
Não será inútil recordar que há neurologistas, treinados para investigar, a escrever sobre Frida Kahlo, em jornais científicos: a ideia de escrever um artigo científico sobre uma peça que esteve dentro de um museu é interessante em termos de intersetar esses territórios / e fundir essas questões. Como aconteceu com a interpretação científica de The Broken Column (1944), realizado logo após uma cirurgia à coluna, em que o tronco de Frida aparece rasgado para revelar uma coluna iónica rachada à beira de se desmoronar. Kahlo é mostrada unida por uma braçadeira de aço e, embora a sua expressão seja estóica, as lágrimas escorrem-lhe pelo rosto. Os muitos auto-retratos de Frida Kahlo são frequentemente lidos como uma expressão externa da sua batalha interna de décadas contra a deterioração da saúde e a dor crónica.
Graças a trabalhos como estes, as experiências de Kahlo com a deficiência depois de sobreviver a um devastador acidente de viação aos 18 anos são bem conhecidas. Surpreendentemente, no entanto, estas pinturas e os relatos escritos da artista mexicana sobre a sua condição também forneceram base suficiente para uma equipa de neurologistas em Espanha dar a Kahlo um diagnóstico póstumo de síndrome da cauda equina (CES). As suas descobertas foram recentemente publicadas no “Journal of Neurology.”

Frida Kahlo: La Columna Rota, 1944. Museo Dolores Olmedo Patiño, Cidade do México
Os investigadores interpretam The Broken Column como prova de que “a coluna vertebral fraturada de Kahlo [era] a principal fonte da sua dor”. Morreu aos 47 anos, em 1954, após uma fusão espinhal mal sucedida de três vértebras deslocadas que resultou numa infeção. Segundo o artigo, “a CES é uma condição rara causada por lesão compressiva na coluna lombar que afeta algumas ou todas as raízes nervosas periféricas”, em particular os nervos da cauda equina na parte inferior da medula espinhal. Vem com sintomas como dor lombar, dor nas pernas, fraqueza nas pernas, dormência ou outras sensações como formigueiro.
“Este estudo é um relato de caso histórico e, como tal, tem várias limitações”, reconhecem os investigadores, citando a falta de dados abrangentes de um exame neurológico completo de Kahlo. Acrescentam, no entanto, que “a ligação entre a sua arte e as suas condições médicas acrescenta profundidade à compreensão do seu trabalho e da sua história de vida”.
E à uma pintura de Van Gogh, A Noite Estrelada, bela mas também surpreendentemente precisa cientificamente. Os fluxos turbulentos é um dos conceitos mais complexos que a natureza já deu ao homem, difícil de calcular matematicamente com uma equação e difícil de descrever fisicamente do ponto de vista energético.
Van Gogh, quando pintou a sua famosa Noite Estrelada, estava a antecipar em pelo menos sessenta anos a descrição deste fenómeno, com uma precisão que impressionou até os estudiosos. Passados 60 anos da criação da pintura, o matemático russo Andrey Kolmogorov tentou identificar uma fórmula matemática para descrever a turbulência. Descobriu que a aparência do fluxo turbulento só poderia permanecer inalterada se os turbilhões maiores transferissem energia para os mais pequenos, e assim por diante. As medições experimentais revelaram que a equação de Kolmogorov chegou incrivelmente perto de descrever como funcionam os movimentos atmosféricos, mas não exatamente.
Os fluxos turbulentos continuam a ser um fenómeno que a física não consegue explicar. Em 2004, cientistas que estudavam imagens obtidas pelo telescópio Hubble observaram uma nuvem de poeira em torno de uma estrela e lembraram-se imediatamente da Noite Estrelada de Van Gogh.
Os cientistas dedicaram-se ao estudo detalhado da luminância e descobriram que existe um padrão oculto de estruturas fluidas turbulentas muito precisas nas pinturas de Van Gogh, que se assemelha muito à equação de Kolmogorov. Assim, os especialistas descobriram que as pinturas produzidas durante o período de agitação psicótica de Van Gogh retratam os redemoinhos e turbilhões de uma forma extraordinariamente realista e matemática.

Vincent Van Gogh, A Noite Estrelada, 1889. MoMA
Seria muito fácil concluir que foi uma mente matemática que sugeriu a Van Gogh esta forma para dar este céu estrelado, mas a ideia de que um período de confusão e sofrimento levou o artista a perceber os segredos mais íntimos da natureza, que parece complexo e incompreensível para uma mente lúcida e racional, tem um encanto inegável. A arte, portanto, pode ser premonitória!
Vivemos realmente num só mundo, que a matemática é global e que a Arte ultrapassa as fronteiras da ciência para nos falar a todos.
Existe um claro limite da ciência, para além do qual só a arte pode ocupar-se — por um lado, aqueles problemas que são rejeitados pela ciência, por não serem minimamente acessíveis a um tratamento racional (aquilo que não pode ser visto e explicado), e por outro lado, aqueles problemas que a ciência no seu progresso mais lento, + exato, ainda não abarca. O património da arte, entre o já não e o ainda não, inclui todo o domínio da experiência/ exploração irracional, situando-se precisamente, no terreno fronteiriço em que o irracional se manifesta como acto e se torna possível exprimi-lo e representá-lo - portão que conduz a um mundo encantado de experiências extraordinárias, que transcendem as fronteiras científicas.
As suas enormes belezas e complexidades podem ser extremamente irracionais, movidas e influenciadas pelas emoções sujeitas a todos os tipos de contradições. Com ela é possível dizer tudo o que se quiser: a conjectura + insensata e o seu contrário, uma afirmação impossível e a negação dessa impossibilidade.
Mas é conclusiva enquanto resposta à forma interrogativa do que lhe vem ao encontro a partir do exterior. Porque não mente. A sua própria tensão é significativa na relação com a tensão externa. Isso é no fundo o que é a arte da descoberta, a arte pura (pesquisa + abstrata orientada para questões conceptuais). Caso contrário, é apenas arte aplicada e pouco + (por exemplo arte com aplicações de uso imediato, por exemplo a criação de uma estética).
O poder e a beleza da arte é inesgotável e a sua transmissão ao longo dos tempos é o seu legado. Duchamp: “A arte é um jogo entre todos os homens de todas as épocas”. Não há fim da arte possível. Esclarecedor quanto à ambição da arte!
No entanto seria um erro ver neste resultado a expressão de uma atitude crítica para com a ciência.
Afinal a ciência tem poderes capazes de descrever o que “nós sabemos” do mundo (as leis da natureza), a informação que temos do mundo, de influenciar, convencer e desvendar avanços tecnológicos para a transformação da medicina, da economia ecológica, etc. De certo modo é capaz de esboçar os infinitos destinos do mundo. É este poder científico que a arte, obviamente não possui.
A arte tem outros poderes… ninguém repara na arte, mas, quando a descobrem e a observam com atenção, veem uma coisa prodigiosa, como uma teia de aranha. A teia de aranha nada tem a ver com a história, a política ou a opressão, existe numa realidade diferente dessas coisas e, obviamente, é muito + fraca e frágil do que elas. Está + ligada à sobrevivência que ao poder ou à violência - sobrevive, apesar deles. Mesmo que a desmanchem, por entre cataclismos como o totalitarismo de Putin, deitando a perder todo o trabalho que exigiu, a obra recomeça noutro canto do quarto. Mesmo que ninguém queira saber dessa teia, construí-la exige enorme persistência e paciência, embora num instante se possa desmanchar, sem ninguém reparar.
O que significa isto!, arte é política ou não?
Alguns entenderão que a arte é útil como instrumento de transformação política, ou podem chamar activismo. E isso faz com que seja algo que eles podem gostar ou não (essas pessoas, na maioria das vezes são ideológicas). Mas também podem chamar-lhe simplesmente vida. Nao se trata de uma propaganda ideológica. Trata-se de questionar e tentar dar sentido a algumas coisas para eles mesmos [artistas] e colocá-las em arte. Refletir estética e artisticamente. Acontece que os momentos de introspecção como estes, alinham-se com o que está a acontecer no mundo de qualquer maneira.
Na declaração final no seu julgamento de 2012, Nadya Tolokonnikova [Pussy Riot] disse: “A arte de criar a imagem de uma era não conhece vencedores ou perdedores. Da mesma forma, os poetas da OBERIU permaneceram artistas, verdadeiramente inexplicáveis e incompreensíveis, mesmo depois de serem expurgados em 1937. [O poeta] Alexander Vvedensky escreveu: o inexplicável agrada-nos, e o incompreensível é nosso amigo. As atividades elevadas e refinadas de OBERIU, a sua procura por pensamento à beira do significado, acabaram custando-lhes as suas vidas, tomadas pelo Grande Terror sem sentido e verdadeiramente inexplicável. Eles pagaram com as suas vidas para mostrar que estavam certos em acreditar que a falta de senso e a falta de lógica expressavam melhor a sua era. Eles fizeram da arte história.”
Que Tolokonnikova foi atraída pelo tipo de arte que tem ambições idealistas e rebeldes, é evidente… E este é um método eficaz de transformação social? pergunto. Durante uma mesa redonda em Seul, em agosto (2025), o artista Ernest A. Bryant III foi convidado a responder a uma pergunta do público que se tornou cada vez mais comum nos últimos anos: o que devem os artistas fazer num momento histórico tão saturado de horror ao ponto de fazer com que todos se sintam impotentes? A sua resposta foi refrescantemente direta: "Os artistas devem fazer arte”.
De certa forma a arte não pode ser apelidada de ideológica ou anti-ideológica, mas precisamente de estética. Não é política em si, mas ambas [arte e política] são actividades ligadas à vida, não indiferentes nem separadas. Derivada do grego, política, significa: algo que tem a ver com a organização, direção e administração de estados; é usada livremente como um termo abrangente para a vida dos seres, sociedade, comunidade. Arte, do latim, significa: conhecimento ou maneira de fazer, e outras definições relacionadas com criatividade e interpretação.
“O medo está a surgir novamente, ajuda-me a afastá-lo” é um apelo da canção Panic Attack de Tolokonnikova, testemunhando a ansiedade de uma jovem presa em condições adversas e a força que conseguiu mobilizar (o seu sustento em tempos difíceis). As suas invocações repetitivas, semelhantes a orações, baseiam-se na provação psicológica dos dois anos de encarceramento da artista e no desafio necessário para recuperar a sua actividade física. Tudo o que arriscou e sacrificou, e o preço que pagou pela sua integridade artística e intelectual. É claro que isto não acontece apenas com Tolokonnikova. Não será a única que tenta fazê-lo.
Afinal, olhar pelo lado bom e acreditar que tudo dará certo no meio da opressão de Putin - expressa esperança, deixando de lado o medo. É esse tipo de esperança que procura fazer avançar o mundo!
Sabemos quanto da arte de Nadya Tolokonnikova sobreviverá? “A verdade é beleza, beleza, verdade, é tudo o que se conhece na terra e tudo o que se precisa saber.” Esta é uma frase de Keats acho eu.
Numa dimensão importante o trabalho de Faith Ringgold (1930-2024) aprofunda a questão: A obra de arte é política em si mesmo?
As obras de Ringgolg por muito tempo excluídas das narrativas históricas da arte, são francas e implacáveis no que retratam (conflitos raciais, problemas de género). Como artista e autora infantil, Ringgold (Harlem, Nova Iorque) desafiou as percepções da identidade afro-americana e da desigualdade de género durante mais de cinco décadas. Tendo crescido no contexto criativo e intelectual do Harlem Renaissance e inspirada pelos seus contemporâneos, incluindo os escritores James Baldwin e Amiri Baraka, é amplamente reconhecida pelas suas colchas de histórias pintadas que combinam narrativas pessoais, história e política "para contar a minha história, ou, mais precisamente, o meu lado da história", como uma mulher afro-americana.
Na década de 1970, o seu trabalho e política abraçaram o feminismo quando liderou protestos à porta de museus de Nova Iorque exigindo igualdade de género e representação racial em exposições, desenhou cartazes políticos e coorganizou o People's Flag Show, pelo qual foi presa. Um contributo conjunto para o activismo pela arte e pela política.
As pinturas de Ringgold mudaram na década de 1970 dos óleos tradicionais para as suas primeiras obras bordadas com tecido, inspiradas nas pinturas tanka tibetanas, que Ringgold fez em colaboração com a sua mãe Willi Posey, uma designer de moda. Isto levou, na década de 1980, às primeiras colchas de histórias de Ringgold, onde finalmente conseguiu "publicar" os seus escritos. Ela disse: “Há tanta liberdade na Liberdade de Expressão, eu poderia escrever o que quisesse na minha arte – ninguém me poderia impedir”.
Estas obras tecem imagens e textos na tradição da manta de retalhos transmitida pela linhagem feminina da sua família desde a sua trisavó, que nasceu na escravatura. Dos telhados de Harlem e dos clubes de jazz, ao metro de Nova Iorque repleto de graffiti e uma biografia radical da Tia Jemima, o rosto de uma marca de mistura para panquecas, as colchas afirmativas da Ringgold celebram uma miríade de vida, cultura e aspiração. Arte e política emparelhadas implicam um entrelaçamento, um contributo conjunto para o activismo / transformação social pela arte e pela política (como macho e fêmea). À medida que as suposições e preconceitos culturais persistem, o trabalho de Ringgold mantém a sua ressonância contemporânea. Esta é a sua influência na arte mundial!

Impensável contrariar a beleza!
victor pinto da fonseca
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Biliografia: Notas Finais: enquanto escrevia Deus, os Dados, Gödel e a Natureza da Arte, fui lendo diversos livros desde autores científicos a romances: a teoria física poder ser encontrada nos seguintes livros: Carlo Rovelli, “O Abismo Vertiginoso”; Michio Kaku, “A Equação Divina”; Giorgio Parisi, “A Minha História na Fisica”; Guido Tonelli, “Génesis”;