HILDA REISCONTINUA NA PÁG. 39![]() LARGO RESIDÊNCIAS / QUARTEL DO LARGO DO CABEÇO DE BOLA Largo Cabeço da Bola 1150-081 LISBOA 22 MAR - 09 ABR 2023 ![]() ![]() INAUGURAÇÃO: 22 de Março, nas Largo Residências - Quartel do Largo do Cabeço de Bola, Lisboa [quarta a domingo das 12h às 23h] CONTINUA NA PÁG. 39 de Hilda Reis Esta é a maior exposição de Hilda Reis realizada em Lisboa. Os trabalhos apresentados em “Continua na pág. 39” são resultado de um encontro da artista com documentos pessoais que foram recolhidos em vários países da Europa. Todos temos uma gaveta onde guardamos lembranças ou papéis: fotografias, cartas, bilhetes de comboio, recortes de jornais, contas da água, receitas para cozinhados, e tudo mais que possa representar uma memória. Das gavetas das memórias pessoais de alguém, partiu a intenção desta exposição, uma homenagem e a construção de uma ficção, uma nova vida, que podia ser um livro em vez de um trabalho plástico. O que foi encontrado nas gavetas é surpreendente, às vezes muito tocante. Um tributo a qualquer pessoa ou a uma pessoa imaginária, e a prova de que ela existe ou existiu é que deixou rasto, teve uma gaveta. A artista cria, de uma forma muito íntima, uma ligação com desconhecidos, que acaba por ser ela própria, desconhecida de si. Há trabalhos que foram feitos a chorar, mas com uma melancolia feliz, por constatar o deslumbramento de se ser pessoa. ::: Hilda Reis é natural do Porto. Estudou Artes Visuais e viveu 10 anos entre a Alemanha e a Suécia, onde realizou várias exposições individuais e colectivas. Desde 2017, quando regressou a Portugal, tem exposto os seus trabalhos no Porto e em Lisboa, sem muitas regras, tanto em galerias como em feiras de arte. Tem trabalhos em colecções privadas, principalmente na Alemanha. Não gosta de dar entrevistas, o seu trabalho é muito expositivo de si própria e considera que já está vulnerável demais ao fazer uma exposição. Ao seu atelier, em Miramar, vão parar muitos papéis e fotografias que chegam de todo o lado. É a partir deste material, e sempre com o foco na memória do desconhecido, que tem desenvolvido a sua pesquisa e os seus trabalhos. ::: Regina Guimarães escreve sobre o trabalho de Hilda Reis O encanto do trabalho plástico recentemente revisitado da muito misteriosa artista Hilda Reis lançou-me num devaneio desenfreado acerca da origem do «collage» que eu julgava «totalmente» inventado pelos cubistas e dadaístas os Picasso, os Braque, os Gris, os Hoch, os Ernst, os Schwitters. Constato com renovado espanto o imenso que a partilha de fantasia com uma pessoa desconhecida (ou seja aquilo que a obra de arte proporciona, seja ela fruto selvagem da recuperação e aproximação de materiais diversos e dispersos ou outra forma radical do mexer na vida) permite descobrir. No presente caso descubro que bem antes dos vanguardistas do início do século XX já certas mulheres, pertencentes às classes privilegiada da sociedade vitoriana, praticavam o «cut up» com desenvoltura criando paisagens inusitadas. Embora francamente menos sofisticadas do que as de HR, essas tais colagens feitas por mãos femininas em vésperas do nascimento do cinema (1860-1870) são suas primas direitas ... [1] Há nas paisagens minimais e emocionais de Hilda Reis um travo a segredo que se concretiza como a figuração dum «entre»: «entre» um antes e um agora, um agora e depois «entre» um aqui e um ali, um ali e um além «entre» um dentro e um fora, um existir e um desistir. Visualmente, esse «entre» é figurado como falha, intervalo, intermitência. Porém insistir em estar é a insolência indisfarçada que prevalece e nos interroga. Os seres de saias ou calças que habitam estas paisagens quase abstractas mas todavia carregadas de dramatismo pressentem (ou não fossem elas-eles personagens de colagem) que por detrás de si pode haver uma outra camada de mundo acima de si uma cortina de palco e a seu lado um imediato precipício. Ao contrário do que acontece com os seres reais estas criaturas que Hilda Reis arranca ao lixo? ao vazio? ao esquecimento? não pedem licença – entram sem cerimónia nem compasso de espera e ficam em nossa companhia porque embora transbordantes elas cabem no modesto enquadramento troçando dos que se julgam ao abrigo da moldura. São nossas vizinhas passionais e entregam-nos recados escritos. Escondem qualquer coisa como os biombos dissimulam nudez, ou melhor, dissimulam a passagem do vestido para o despido. Buscam na cor um suplemento de irrealidade que, por paradoxo, as torna mais palpáveis. Estão entre a condição do anão e o sonho do gigante. Entre a formiga e o elefante gostariam de escolher a cigarra. À falta de saída airosa, farão copy paste e ficarão no beco com mais dignidade do que os reis no trono... Regina Guimarães [1] As artistas canadianas Miriam Schapiro e Melissa Meyer, a propósito da origem do collage, desenvolveram o conceito de «femmages» (a partir da palavra «femme»/mulher), cuja natureza descrevem do seguinte modo: obras de arte feitas por mulheres, destinadas à partilha com o círculo de pessoas próximas, compostas por fragmentos reciclados, que privilegiam as ideias de colheita e salvaguarda e contêm elementos visuais secretos bem como elementos verbais, cujo tema se inscreve no quotidiano feminino, parentes do diário íntimo. Os «femmages», tal como os «collages», recorrem a imagens recortadas, detalhes de fotografias ou pedaços de material impresso... Estas especificações poderiam pertinentemente descrever, com bastante rigor, uma fatia do trabalho de Hilda Reis. ![]() |
