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EXPOSIÇÕES ATUAIS


O mundo segue indiferente a nós (2021). Instalação, feltro, dimensões e configurações variáveis. © José Caldeira


Instalação O mundo segue indiferente a nós (2021) e Process (2021), vídeo, looping, 2’03’’. © José Caldeira


Instalação O mundo segue indiferente a nós (2021) e Process (2021), vídeo, looping, 2’03’’. © José Caldeira


Instalação O mundo segue indiferente a nós (2021) e Process (2021), vídeo, looping, 2’03’’. © José Caldeira


Énupla (2021), escultura, feltro, aprox. 128x50x5,5 cm. © José Caldeira


Énupla (2021), escultura, feltro, aprox. 128x50x5,5 cm. © José Caldeira


O mundo segue indiferente a nós (2021) Incisões em papéis, série. Nº32 a Nº37, 29,7X21cm cada. © José Caldeira


O mundo segue indiferente a nós (2021). Incisões em papéis, série. Nº32, 29,7X21cm.


O mundo segue indiferente a nós (2021). Incisões em papéis, série. Nº33, 29,7X21cm.


O mundo segue indiferente a nós (2021). Incisões em papéis, série. Nº35, 29,7X21cm.

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A PONTE, O CAMPANÁRIO, A CASA E O BARQUEIRO


Centro Cultural de Cascais, Cascais
FÁTIMA LOPES CARDOSO

ARQUIVO:


SUZANA QUEIROGA

O MUNDO SEGUE INDIFERENTE A NÓS




MAUS HÁBITOS - ESPAÇO DE INTERVENÇÃO CULTURAL
Rua Passos Manuel, 178, 4º
4200-382 Porto

11 JUN - 25 JUL 2021

A Indiferença do Mundo segundo Suzana Queiroga

 

 

O Mundo Segue Indiferente a Nós, de Suzana Queiroga (1961), produzida pela Saco Azul Associação Cultural, promove um encontro entre o público e a arte contemporânea. Influenciada pelo período de crise pandémica atual, a artista luso-brasileira aborda questões relacionadas com o tempo, fluxos, conceitos de infinito e finitude, numa mostra de elevado grau de envolvimento emocional e dimensão sociopolítica.

 

Em evidente contradição com o título que dá nome à exposição com curadoria de Tales Frey, a instalação O mundo segue indiferente a nós (2021) imediatamente surpreende e atrai o olhar e a curiosidade do espetador. Ocupando um lugar central na sala de exposições, a grandiosa instalação que se estende desde o tecto até ao chão, intriga-nos ao mesmo tempo que nos envolve num universo aparentemente leve, frágil e delicado. À medida que a percorremos contornando-a e observando-a sob diversos ângulos, num exercício de proximidade, de relação e interação com a obra, são-nos desvendadas camadas que se cruzam e intercetam dentro de uma lógica de sobreposições metafóricas e reais que acompanham a exposição. A partir da instalação Suzana Queiroga cria situações plásticas e visuais que promovem uma reflexão sobre a relação do observador com o objeto artístico e da imagem como veículo de interrogação sobre a realidade. Recorrendo à escada enquanto signo, a artista revela-nos um tempo em suspensão como suspensas se apresentam as múltiplas escadas no tecto da sala e que de modo fluido correm até ao chão onde se encontram e emaranham num enorme novelo em cujo azul desejamos mergulhar. Símbolo por excelência da ascensão e da valorização, artefacto citado na bíblia como tendo sido sonhado por Jacob e destinado a entrar e sair do céu, em perpétuo estado de graça, as escadas de Suzana Queiroga em O mundo segue indiferente a nós acentuam a dificuldade do percurso ascensional. Ao mesmo tempo que remetem uma ligação ao Sagrado, uma ligação entre o mundo terreno e o transcendental, enfatizam pela sua delicadeza e vulnerabilidade a insegurança, o medo, o temor e a provação da ascensão. Escadas do defeito, construídas “entre” o céu e a terra, escadas que não suportam peso, que se rasgam facilmente e que servem enquanto metáfora à artista para falar da fragilidade das nossas vidas e da ideia de vida eterna. Há nesta obra um confronto direto com a nossa própria mortalidade, ideia de finitude e perda que de forma velada e ilusoriamente inocente, perpassa toda a exposição com elegância. A decisão de Suzana Queiroga em questionar, explorar e pensar a relação com a morte e uma vida pós-morte, encontra-se intrinsecamente ligada ao momento pandémico atual, depois desse ano de pandemia são três milhões de pessoas no mundo, e a situação que vivemos é apavorante. Uma relação com a morte muito grande e eu pensei em falar disso. [1] Se por um lado a escada enquanto signo nos remete para a ideia reconfortante de acesso a um plano não terreno, da morte enquanto redenção e da existência de um mundo eterno, por outro lado somos confrontados com a impossibilidade ao seu acesso [2], aspeto reforçado pela matéria-prima utilizada na concepção da instalação: o feltro. Assim como a delicadeza do tecido, incapaz de suster o peso de um corpo, evoca a fragilidade da vida humana, ao utilizar uma matéria têxtil com propriedades isolantes, a artista expõe o período de crise sanitária atual e comenta a circunstância vigente de isolamento em unidades familiares, espaços compartilhados de moradia, ou domicílios individuais, contudo também narra o permanente risco diante de um vírus que transpõe fronteiras. [3] Em diálogo direto com a instalação e dando continuidade à reflexão de cariz social e político da artista, a obra em vídeo Process (2021) apresenta-nos num loop contínuo, escadas que se sucedem interruptamente numa clara alusão às vidas que a cada segundo se perdem, resultado da crise pandémica que atravessamos.

 

O mundo segue indiferente a nós (2021)
Incisões em papéis, série. Nº34, 29,7X21cm.

 

Fortemente influenciada pelo contexto pandémico atual e as tragédias que lhe estão associadas, a artista iniciou em Portugal no ano de 2020 um processo reflexivo que se materializou numa série de trabalhos em papel que estão na génese da exposição agora apresentada. Os seis trabalhos que compõe a série O mundo segue indiferente a nós (2021), em exibição nas vitrines da oficina dos Maus Hábitos, rapidamente cativam a atenção do espetador pela variedade cromática, vibração, ritmo e gestos impressos. As múltiplas formas que a artista cria no papel através de incisões, conferem à série uma dimensão quase escultórica, em que a manipulação e intervenção da matéria pela artista explora a bidimensionalidade e a tridimensionalidade, promovendo diálogos entre o plano, a matéria, a cor e a sombra. Contrapondo-se com a instalação em feltro que se impõe pela escala grandiosa e propicia uma experiência expansiva e relacional com o espetador e o espaço, os trabalhos em papel surpreendem-nos pelas suas reduzidas dimensões, em que o pequeno formato cria uma relação com o corpo e perceção de uma outra natureza, mais intimista e na qual mergulhamos. À medida que observamos a série deixamo-nos surpreender pelas sucessivas camadas de papéis coloridos que compõe cada trabalho, numa descoberta constante de novas leituras, profundidades e cores, num exercício de interação com a obra através da observação e da deslocação, que parece não ter fim. Experiência de fruição que é partilhada pela a artista durante o processo de execução que reflete as possibilidades constantes de transformação. São de fato infinitas as possibilidades de organização das camadas de papéis que compõem a série, mergulhando a artista num processo imersivo e infinito de múltiplas escolhas e indagações. Camadas coloridas e sobrepostas que materializam camadas de experiências, de significados e conexões numa série em que Suzana Queiroga aborda temáticas que acompanham a sua prática artística: o tempo, os fluxos e o infinito.

Para mim esse trabalho contem os traçados urbanos, as cidades e seus fluxos, mas também as redes de neurônios, a diversidade dos padrões moleculares, o tecido cósmico, o macro e o micro e sobretudo o conceito de tempo e de infinito. (...) Tudo o que existe como realidade ou conceito e que segue indiferente a nós. [4]

Partindo da relação com a perda e do confronto com a morte, a ideia de finitude e de infinito - enquanto opostos interdependentes - perpassa toda a exposição não sendo inocentes as incisões no papel e no feltro das obras em exibição. Servindo-se do simples gesto do recorte, a artista retira elementos da superfície do material alterando-o de modo definitivo e construindo, através de ausências presentificadas, esculturas no vazio, camadas que sucessivamente nos revelam algo novo, num projeto expositivo que se situa entre o visível e o invisível, o tangível e o infinito.

 

 


Mafalda Teixeira
Mestre em História de Arte, Património e Cultura Visual pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, estagiou e trabalhou no departamento de Exposições Temporárias do Museu d’Art Contemporani de Barcelona. Durante o mestrado realiza um estágio curricular na área de produção da Galeria Municipal do Porto. Atualmente dedica-se à investigação no âmbito da História da Arte Moderna e Contemporânea, e à publicação de artigos científicos.
 

 

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Notas

[1] Citação da intervenção de Suzana Queiroga, durante a SP-Arte Viewing Room| Suzana Queiroga e Tales Frey|Conexões MBac, no dia 12 de junho de 2021. Vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YszvyE1z-B0. Consultado no dia 21 de junho de 2021.
[2] Temática explorada pela artista na escultura em metal Escada para o Céu, cuja cor azul, o mesmo que dá o tom à sala de exposições do Maus Hábitos, nos remete para o céu. À semelhança da instalação apresentada Escada para o Céu, remete-nos para finitude do nosso ciclo na Terra, todavia também a sua utilização para aceder ao céu se revela uma impossibilidade, pelo fato dos degraus se encontrarem vazados, mantendo-se apenas a estrutura. A obra pode ser visitada na Exposição Parque de Esculturas no Jardim de Glaziou, Petrópolis-Rio de Janeiro, com curadoria de Marcelo Lago, de 30 de maio a 31 de julho.
[3] FREY, Tales – O Mundo Segue Indiferente a nós – Suzana Queiroga. [Folha de sala da exposição], 2021.
[4] Citação da intervenção da artista em Suzana Queiroga-Projeto Arte em Diálogo, Museu Nacional de Belas Artes – MNBA, no dia 4 de dezembro de 2020. Vídeo disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vUtJcPiJLzw. Consultado no dia 21 de junho de 2021.

 

 

 

 



MAFALDA TEIXEIRA